QUE ACÇÃO PARA O
ACTO DE INDEFERIMENTO?
A 1 de Janeiro de 2012, a empresa
X foi notificada, por resolução de Conselho de Ministros, de que havia sido
adjudicada a proposta apresentada pela empresa Y ao concurso público para a
celebração de um contrato de fornecimento de bens, tendo esta última ficado
classificada em primeiro lugar à luz do critério de adjudicação, respectivos
factores e subfactores de densificação e ponderações previstos no Programa do
Concurso e no Regulamento de Avaliação das Propostas.
Considerando ilegal o acto de
indeferimento, a empresa X resolve recorrer aos meios judiciais. Para o efeito,
propõe uma acção administrativa especial com o pedido de impugnação do acto
de indeferimento, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.
Para poder ser
contestado em sede de Processo Administrativo, o acto deve revestir a forma de
acto administrativo, preenchendo os requisitos que constam do art.º 120.º do CPA,
especialmente, possuir conteúdo decisório, definindo situações jurídicas.
O acto
administrativo, no que concerne ao seu conteúdo, pode ser um de três tipos: de
conteúdo positivo, negativo ou ambivalente (simultaneamente de conteúdo
positivo e negativo).
O acto de
indeferimento é o exemplo paradigmático de acto de conteúdo negativo, e, para
este tipo de actos, o legislador considerou que a acção administrativa especial
de condenação à prática do acto devido seria a mais adequada a satisfazer a
pretensão do autor, conferindo-lhe uma tutela mais intensa, evitando o risco da
multiplicação de novos litígios. Esta opção legislativa compreende-se à luz dos
princípios da economia processual e da promoção do acesso à justiça, concretizados
nos preceitos 51.º/4, aproveitando a instância convidando o autor a substituir
a petição, e 66.º/1 e 2, ambos do CPTA. A substituição da petição apresenta a vantagem
de garantir a celeridade na satisfação dos direitos e interesses do particular.
Mas, será sempre assim? E os princípios do
dispositivo e da vinculação do juiz ao pedido?
Em que situações, a existirem, é este
critério legal afastado quando nos encontramos perante um acto de
indeferimento?
Pode o autor ignorar o convite do juiz e
deduzir pedido de anulação ou declaração de nulidade ou inexistência de um acto
de recusa?
Há quem
defenda que o autor pode, efectivamente, não aceder ao convite do juiz, sem que
a falta de correcção do pedido determine sistematicamente a absolvição da
instância, em virtude da deficiência da petição nem sempre ser susceptível de
ser qualificada como obstando ao prosseguimento do processo, de acordo com os
artigos 88.º e 89.º do CPTA. Esta visão é sustentada, também, recorrendo à
comparação entre regimes, dentro do CPTA, nomeadamente o que resulta do art.º
120.º/4, donde se retira uma excepção expressa ao princípio da vinculação do
juiz ao pedido, que não é feita no âmbito do art.º 51.º/4[1]
[2].
Já o Senhor Professor
Mário Aroso de Almeida admite a situação em apreço apenas em casos
excepcionais, onde o autor assuma, justificadamente, que não pretende obter o
acto ilegalmente recusado, mas apenas o reconhecimento judicial da sua ilegalidade
e remoção da ordem jurídica, e quando se admita que tem interesse processual em
obter uma tal providência, que não é satisfeito com a condenação à prática do
acto devido.
Este quadro é,
desde logo, admitido no Direito alemão, verificados os pressupostos processuais
gerais e a necessidade de protecção jurídica.
Uma outra
configuração é a que o art.º 47.º/2, al. a) do CPTA encerra, relativo à
cumulação de pedidos.
Encontramo-nos,
agora, no âmbito de actos administrativos de conteúdo ambivalente, de que é
exemplo o acto de adjudicação de um contrato, como no caso em análise, que
envolve um acto positivo (de adjudicação) e outro negativo (de indeferimento ou
recusa), consequentemente. Nestes casos, o autor pretende que o acto seja
removido da ordem jurídica e substituído por outro. O autor tem de
cumular à acção principal de impugnação do acto acção de condenação à prática
do acto devido.
O regime do
art.º 66.º não assegura esta pretensão, pois faz depender a eliminação do acto
de indeferimento da prossecução da acção de condenação proposta pelo autor. Se
for improcedente, o acto de indeferimento subsistirá.
Bibliografia:
- Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo
- Ana Gouveia Martins, “A Tutela Cautelar no Contencioso Administrativo (em especial, nos procedimentos de formação dos contratos)”, 2002 (tese de mestrado)
[1] Ana
Gouveia Martins, “A Tutela Cautelar no Contencioso Administrativo (em especial,
nos procedimentos de formação dos contratos)”, 2002 (tese de mestrado).
[2]
Situações em que o interessado na prática de um determinado acto pode já não
ter interesse na sua emissão no momento da propositura da acção, mas, contudo, pretende obviar a que a decisão da administração se torne inimpugnável.
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