quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Análise de uma Notícia à luz do C.A.T.


«  Moradores de prédio em risco de ruir travam despejo
Os moradores do prédio que está em risco de ruir, em Vila Franca de Xira, enviaram um requerimento à Polícia para impedir a entrada de funcionários da Câmara no edifício, ou seja, fica inviabilizado o despejo até que haja ordem judicial sobre a providência cautelar já interposta.
A situação tem sido calma ao longo do dia, nomeadamente, quando a PSP chegou à Encosta do Monte Gordo, em Vila Franca de Xira. Os moradores do prédio que ameaça ruir enviaram um requerimento à Polícia para impedir a entrada de funcionários da Câmara no edifício, travando assim a ação de despejo decidida pela autarquia por razões de segurança.
O despejo estava previsto para as 10 horas desta quinta-feira e fica agora sem efeito até que haja decisão judicial sobre a providência cautelar interposta pelos moradores.
Entretanto, esta quinta-feira, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa notificou a Câmara de Vila Franca de Xira para que responda à impugnação apresentada pelos moradores do prédio em risco de ruir, que travou o despejo coercivo.
Fonte ligada ao processo adiantou que, tendo em conta a "especial urgência" do caso, a autarquia possa vir responder no máximo de cinco dias, quando o prazo normal nestes casos são 10 dias.
O executivo camarário de Vila Franca de Xira deliberou proceder ao despejo dos moradores por estar em causa "a segurança de pessoas e bens", segundo o último relatório do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), conhecido na segunda-feira, o qual alerta para o agravamento da instabilidade do prédio e do talude que continua a fazer pressão sobre o lote 2 que está inclinado para a frente.
Um outro relatório do organismo público, datado de julho, recomendava a retirada das famílias que residem no lote 1, do Bloco B, da Encosta do Monte Gordo, (dos 12 apartamentos, nove encontram-se habitados), já que o imóvel do lado, desabitado (lote 2), ameaça ruir e provocar a derrocada do lote 1. »

Publicado a  12-12-2012, Paulo Lourenço, in Jornal de Notícias

Com base no corpo da notícia supra citado, vai-se analisar as questões de contencioso administrativo e tributário implícitas.

Em primeiro lugar, estamos no âmbito de um pedido por parte de um conjunto de famílias do decretamento de uma providência cautelar, nos termos dos artigos 112.º e ss, nomeadamente trata-se de uma providência conservatória de suspensão da eficácia de um acto administrativo (112/2,a)).

Tal pedido é formulado num requerimento, neste caso antes da instauração do processo principal (114/1,a)), que é alvo de despacho liminar, nos termos do art.116.º.

Quanto aos critérios de decisão, previstos no 120.º, é aplicável o disposto no nº1, b), onde se exige na primeira parte o perigo na demora e na segunda a aparência de bom direito.
No tocante ao primeiro critério, neste caso, parece estar verificado, uma vez que tais famílias alegaram não lhes ter sido facultada habitação substitutiva ou temporária, pelo que no caso de não terem mais imóveis ou ajuda, não terão onde habitar. Assim, caberá a estas famílias fazer prova da inexistência de outro sítio para viver. De resto, parece óbvio que existe perigo na demora, uma vez que durante o período a aguardar pela conclusão do processo principal estas famílias não terão onde viver.
Quanto ao segundo critério, o juiz fará uma apreciação superficial e previsível da razão da pretensão do requerente. Neste caso, não é manifesta a legalidade do acto, pelo que existirá a tal aparência de bom direito.

No número 2 do artigo 120.º exige-se uma ponderação dos interesses em jogo, isto é, um juízo de valor entre os interesses a serem seguidos e os que serão sacrificados. Assim, respetivamente, encontramos o direito a uma habitação e a segurança pública.

Neste caso, exige-se uma ponderação que não é assim tão líquida, pois é muito questionável se o direito a ter uma habitação onde viver deva prevalecer sobre a segurança, inclusivamente de quem lá vive. Um critério normalmente utilizado a este respeito é o de ponderar a irreversibilidade do interesse prevalecente, e neste caso, também este critério apresenta dificuldades face à situação apresentada. 
Contudo, por não haver informações sobre um perigo de ruir imediato, poderia defender-se a prevalência do interesse do requerente, não obstante parece-me não ser uma solução apropriada,  dados os vários relatórios sobre a matéria e que apontam no mesmo sentido e sobretudo alertam para o recente agravamento.   

Em segundo lugar, é aplicável a primeira parte do número um do 128º, e tal ocorreu nesta situação, como se depreende na notícia. Poderá haver lugar à segunda parte da mesma disposição legal.

Em terceiro, é possível ocorrer a convalação prevista no artigo 121.º

Em quarto, cumpre analisar  outros requisitos, como a competência do Tribunal e a legitimidade das partes.

Quanto ao âmbito de jurisdição é aplicável o constante no 4.º/1, b) do ETAF
Quanto à competência territorial é aplicável o disposto no artigo 17.º do CPTA, por estar em casa um prédio.Já em função da hierarquia é competente o Tribunal Administrativo de Circulo - 44.º ETAF. 

Quanto à legitimidade activa é aplicável o 9.º/1 e 55/1, a), e no tocante à passiva 10.º/2 do CPTA. 
No tocante à coligação é aplicável o 12.º do CPTA e o disposto sobre esta matéria no CPC (art.1.º do CPTA E 10.º/8 CPC).

Joana Beirão - 19656

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