sábado, 15 de dezembro de 2012

Habeas corpus


O habeas corpus vem expressamente consagrado no artigo 31º da Constituição da República Portuguesa (CRP):

"1. Haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.

2. A providência de habeas corpus pode ser requerida pelo próprio ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos.

3. O juiz decidirá no prazo de oito dias o pedido de habeas corpus em audiência contraditória."

Esta figura foi introduzida em Portugal na Constituição de 1911. Consiste numa providência contra a prisão ilegal, sendo assim uma garantia privilegiada do direito à liberdade (art. 27 da CRP), um dos mais importantes e fundamentais direitos. É ainda regulamentado nos arts. 220º e ss. do Código de Processo Penal, sendo efectivado através de uma petição dirigida ao juiz competente (juiz de instrução da área onde o cidadão se encontre ilegalmente detido) pelo cidadão detido ou por qualquer outro que decida interceder por si, requerendo a sua libertação imediata. De referir que a recusa de apresentação do detido ou preso ao juiz competente será punível com pena de prisão até 3 anos ou multa, se ao caso em apreço não couber pena mais grave em virtude de outra disposição legal, como consta do art. 328º do Código Penal. Esta admissão de um pedido feito por qualquer cidadão constitui uma espécie de acção popular de habeas corpus, pois confere um sentido útil ao mecanismo quando o detido não possa pessoalmente desencadeá-lo, o que sublinha o valor constitucional objectivo do direito à liberdade.

O habeas corpus é um meio ao exclusivo dispor de pessoas singulares e não de pessoas colectivas, uma vez que, por definição, estas não podem ser presas. Ainda que a CRP não o refira, fazendo uso do princípio da equiparação de direitos (art. 15º da CRP), também um estrangeiro poderá requerer a providência de habeas corpus ou que por si intercedam.

A prisão ou detenção será ilegal quando ocorra fora dos casos do art. 27º da CRP, quando efectuada ou ordenada por uma autoridade incompetente ou por forma irregular, quando tenham sido ultrapassados os prazos de apresentação ao juiz ou os prazos estabelecidos na lei para a duração da prisão preventiva ou a duração da pena de prisão a cumprir, quando a detenção ocorra fora dos estabelecimentos legalmente previstos, entre outros.

Para Carla Amado Gomes, esta providência não servirá como meio de reparação de direitos subjectivos lesados nem de repressão das violações cometidas pelos poderes públicos, pois nesse campo o cidadão pode recorrer às vias cíveis e penais respectivas, pelo que a define assim em termos instrumentais como um remédio de excepção para defender a liberdade individual nas situações em que não haja qualquer outro meio legal de fazer cessar a ofensa ilegítima dessa liberdade, pois caso contrário haveria uma duplicação de meios legais de recurso. A finalidade do habeas corpus será conseguida com a cessação da ilegalidade da ofensa.

Juntamente com o direito de resistência e com o recurso aos meios cautelares do processo civil, Carla Amado Gomes refere a providência do habeas corpus como uma das soluções possíveis face ao défice de protecção cautelar contra as operações materiais da Administração.
O prof. Vasco Pereira da Silva admite que, ainda que o habeas corpus não tenha sido exactamente pensado para o contencioso administrativo, é admissível o recurso e a elasticidade desta figura e nesta sede, tendo sido utilizado por ex., aquando da entrada e detenção em Portugal de uma cidadã nacional de um país africano e que seria extraditada em 48 horas, tendo o seu advogado feito uso de tal expediente. Neste exemplo é possível ver uma certa ligação do habeas corpus com as providências cautelares, nomeadamente com a característica do periculum in mora, uma vez que se aquele não fosse decretado o mais rapidamente possível, tornar-se-ia inútil pois a cidadã seria extraditada.
 
Bibliografia:
GOMES, Carla Amado - "Textos dispersos de Direito do Contencioso Administrativo" - 2009


Frederico F. F. Soares Nº 17292
Escrito em desacordo com as regras do novo acordo ortográfico

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