Até à reforma, a figura da providência cautelar reduzia-se
ao instituto da suspensão da eficácia de actos administrativos. A par desta
surgiu a intimação para um comportamento através da LPTA que, contudo, não
valia contra a administração pelo que não tutelava inteiramente os direitos
pretendidos, pelo que, em matéria de providência cautelar acabava então por
valer um só instituto que em muito pecava.
Por esta altura, os meios cautelares eram um conjunto de
meios processuais acessórios, onde existiam lado a lado com outras figuras como
a execução de julgados que neste âmbito figura na verdade como um processo
principal. A suspensão da eficácia não era então, mais do que um instrumento
acessório em relação aos processos de anulação de actos administrativos, o que
é por si um indicio do quanto o contencioso se reduzia ao recurso contencioso
de anulação.
Deste modo, só funcionaria devidamente, proporcionando uma
verdadeira tutela efectiva nos casos em que era possível ao processo atribuir
tutela final efectiva, ou seja, quando o interessado apenas se opusesse a uma inovação
de conteúdo lesivo que tivesse sido introduzido por um acto de conteúdo positivo,
sendo este o meio típico vocacionado no domínio de impugnação anulatória de
actos administrativos de conteúdo positivo.
Para tutelar uma posição jurídica de conteúdo pretensivo
dirigida à prática de acto administrativo, o mecanismo de suspensão não tem o
alcance exigido para ser capaz de proporcionar uma tutela cautelar efectiva. Concluía
se então pela lacunosidade do plano de tutela final, por só prever o recurso de
anulação de actos administrativos, por só prever o recurso de anulação e não
permitir que os tribunais condenassem a Administração à prática de actos devidos
e, paralelamente, no plano da tutela cautelar por se centrar no instituto da
suspensão da eficácia de actos administrativos.
Contudo, o novo contencioso administrativo português é neste
momento, o único cuja constituição prevê expressamente um direito dos administrados
à protecção cautelar, referindo expressamente a protecção cautelar adequada
como uma dimensão do principio da tutela jurisdicional efectiva e sendo, nesta
medida, impulsionada por doutrina e jurisprudência que desde a reforma de 1989
vinham a marcar passo para a evolução de uma figura que exigia agora regulação
jurisdicional que a cobrisse por completo.
“O processo cautelar é
um processo que tem uma finalidade própria: visa assegurar a utilidade de uma
lide principal, isto é, de um processo que normalmente é mais ou menos longo,
porque implica uma cognição plena”
O Dr. Carlos Vieira de Andrade justifica esta sua designação
pelo processo cautelar visar especialmente garantir o tempo, prevendo para os
casos em que, mesmo julgando dentro dos prazos, há um tempo necessário que tem
de se cumprir, para que as partes não percam o interesse na sentença, sendo
para estes casos que o processo cautelar surge como uma garantia para a
utilidade da sentença que venha depois a ser proferida definitivamente.
Nestes termos e face à prevenção da demora de uma sentença
final, podemos então referir-nos às suas características como:
1)A instrumentalidade, na medida em que o processo cautelar só pode ser desencadeado por quem tenha legitimidade para intentar um processo principal e se defenir por referencia a esse processo principal em ordem a assegurar a utilidade de sentença que nele virá a ser proferida (112.º/1);
2)A provisoriedade, visto que não está em causa
uma sentença definitiva da sentença, antes um caracter efémero deste meio
processual que caduca com a sentença;
3)E a sumaridade, visto que as apreciações que devem ter lugar nesta altura do processo, deverão ser baseadas num juizo sumario sobre os factos a apreciarm evitante antecipar juízos definitivos que, só devem ter lugar no processo principal;
Será tendo em conta estas três características fundamentais
dos processos cautelares que é então possível distingui-los dos processos
urgentes, que são nesta vertente, processos principais que visam uma resposta
urgente e definitiva.
As providências cautelares têm vindo a ser admitidas muito
genericamente, pelo que a lei admite providências que dependendo da natureza do
processo, sejam, acima de tudo, adequadas a garantir a utilidade da sentença,
havendo uma enumeração taxativa no 112.º/2, pelo queàs providencias
conservatórias que visam manter ou preservar a situação de facto, acresentam-se
agora as providencias antecipatórias que por sua vez visam prevenir o dano,
obtendo a disponibilidade do bem a título provisório.
A lei vem então estabelecer novos critérios à luz dos quais
o art 120.º deve ser interpretado para a concessão de cada providência, num
primeiro plano, há que ter em conta os diversos interesses em questão
determinando que a providência deverá ser recusada caso os danos que
resultariam da concessão desta se mostrem superiores, contrabalançando assim os
interesses e eventuais riscos que eventualmente advirão da concessão da
providência cautelar. Com este critério, põe-se então em prática o principio da
proporcionalidade, avaliando os resultados de cada uma das alternativas. Contudo,
este princípio não se esgota nesta vertente, sendo essencial para o tipo de providência que
mais se adequa.
Outro corolário a que se atribui agora relevo para a decisão
de atribuição da providencia é o fumus
boni iuri, o poder e dever do juiz avaliar a probabilidade de procedência da
acção principal, a chamada aparência de direito, é um factor de racionalidade
que vai pesar, mais uma vez nos interesses em jogo.
Um último critério que releva enunciar está também
consagrado no art 120.º/1, por estabelecer a exigência de “fundado receio da
constituição duma situação de facto consumado ou da produção de difícil reparação
para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.”Exige-se
então que seja feito uma análise segundo um juízo prognostico que nos dirá se a
concessão de tal sentença venha a ser inútil, por entretanto se ter consumado
uma situação de facto incompatível com ela ou por se terem produzido prejuízos que
obstam à reintegração especifica da esfera jurídica,
Contudo, todos estes critérios acabam por ser exigíveis na
atribuição da providencia cautelar no caso concreto, permitindo manter uma
unidade no sistema, visto o alargamento no âmbito de matérias que as providências
cautelares podem agora tutelar, e a que cada vez mais recorrem para tutelar os
interesses próprios, tendo-se revelado como um instrumento de fácil acesso.
Mariana Roque, nº18282
Bibliografia:
«O contencioso administrativo no divã da psicanálise», Vasco Pereira da silva;
«A justiça administrativa», José Carlos vieira de Andrade;
«O novo regime do processo nos tribunais administrativos», Mário Aroso de Almeida;
«Manual de Processo administrativo», Mário Aroso de Almeida.
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