quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

A tutela cautelar na Reforma Administrativa


Até à reforma, a figura da providência cautelar reduzia-se ao instituto da suspensão da eficácia de actos administrativos. A par desta surgiu a intimação para um comportamento através da LPTA que, contudo, não valia contra a administração pelo que não tutelava inteiramente os direitos pretendidos, pelo que, em matéria de providência cautelar acabava então por valer um só instituto que em muito pecava.
Por esta altura, os meios cautelares eram um conjunto de meios processuais acessórios, onde existiam lado a lado com outras figuras como a execução de julgados que neste âmbito figura na verdade como um processo principal. A suspensão da eficácia não era então, mais do que um instrumento acessório em relação aos processos de anulação de actos administrativos, o que é por si um indicio do quanto o contencioso se reduzia ao recurso contencioso de anulação.
Deste modo, só funcionaria devidamente, proporcionando uma verdadeira tutela efectiva nos casos em que era possível ao processo atribuir tutela final efectiva, ou seja, quando o interessado apenas se opusesse a uma inovação de conteúdo lesivo que tivesse sido introduzido por um acto de conteúdo positivo, sendo este o meio típico vocacionado no domínio de impugnação anulatória de actos administrativos de conteúdo positivo.
Para tutelar uma posição jurídica de conteúdo pretensivo dirigida à prática de acto administrativo, o mecanismo de suspensão não tem o alcance exigido para ser capaz de proporcionar uma tutela cautelar efectiva. Concluía se então pela lacunosidade do plano de tutela final, por só prever o recurso de anulação de actos administrativos, por só prever o recurso de anulação e não permitir que os tribunais condenassem a Administração à prática de actos devidos e, paralelamente, no plano da tutela cautelar por se centrar no instituto da suspensão da eficácia de actos administrativos.
Contudo, o novo contencioso administrativo português é neste momento, o único cuja constituição prevê expressamente um direito dos administrados à protecção cautelar, referindo expressamente a protecção cautelar adequada como uma dimensão do principio da tutela jurisdicional efectiva e sendo, nesta medida, impulsionada por doutrina e jurisprudência que desde a reforma de 1989 vinham a marcar passo para a evolução de uma figura que exigia agora regulação jurisdicional que a cobrisse por completo.
“O processo cautelar é um processo que tem uma finalidade própria: visa assegurar a utilidade de uma lide principal, isto é, de um processo que normalmente é mais ou menos longo, porque implica uma cognição plena”
O Dr. Carlos Vieira de Andrade justifica esta sua designação pelo processo cautelar visar especialmente garantir o tempo, prevendo para os casos em que, mesmo julgando dentro dos prazos, há um tempo necessário que tem de se cumprir, para que as partes não percam o interesse na sentença, sendo para estes casos que o processo cautelar surge como uma garantia para a utilidade da sentença que venha depois a ser proferida definitivamente.
Nestes termos e face à prevenção da demora de uma sentença final, podemos então referir-nos às suas características como:
  1)A instrumentalidade, na medida em que o processo cautelar só pode ser desencadeado por quem tenha legitimidade para intentar um processo principal e se defenir por referencia a esse processo principal em ordem a assegurar a utilidade de sentença que nele virá a ser proferida (112.º/1);
 
 2)A provisoriedade, visto que não está em causa uma sentença definitiva da sentença, antes um caracter efémero deste meio processual que caduca com a sentença;
 
  3)E a sumaridade, visto que as apreciações que devem ter lugar nesta altura do processo, deverão ser baseadas num juizo sumario sobre os factos a apreciarm evitante antecipar juízos definitivos que, só devem ter lugar no processo principal;
 
Será tendo em conta estas três características fundamentais dos processos cautelares que é então possível distingui-los dos processos urgentes, que são nesta vertente, processos principais que visam uma resposta urgente e definitiva.
As providências cautelares têm vindo a ser admitidas muito genericamente, pelo que a lei admite providências que dependendo da natureza do processo, sejam, acima de tudo, adequadas a garantir a utilidade da sentença, havendo uma enumeração taxativa no 112.º/2, pelo queàs providencias conservatórias que visam manter ou preservar a situação de facto, acresentam-se agora as providencias antecipatórias que por sua vez visam prevenir o dano, obtendo a disponibilidade do bem a título provisório.
A lei vem então estabelecer novos critérios à luz dos quais o art 120.º deve ser interpretado para a concessão de cada providência, num primeiro plano, há que ter em conta os diversos interesses em questão determinando que a providência deverá ser recusada caso os danos que resultariam da concessão desta se mostrem superiores, contrabalançando assim os interesses e eventuais riscos que eventualmente advirão da concessão da providência cautelar. Com este critério, põe-se então em prática o principio da proporcionalidade, avaliando os resultados de cada uma das alternativas. Contudo, este princípio não se esgota nesta vertente,  sendo essencial para o tipo de providência que mais se adequa.
Outro corolário a que se atribui agora relevo para a decisão de atribuição da providencia é o fumus boni iuri, o poder e dever do juiz avaliar a probabilidade de procedência da acção principal, a chamada aparência de direito, é um factor de racionalidade que vai pesar, mais uma vez nos interesses em jogo.
Um último critério que releva enunciar está também consagrado no art 120.º/1, por estabelecer a exigência de “fundado receio da constituição duma situação de facto consumado ou da produção de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.”Exige-se então que seja feito uma análise segundo um juízo prognostico que nos dirá se a concessão de tal sentença venha a ser inútil, por entretanto se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela ou por se terem produzido prejuízos que obstam à reintegração especifica da esfera jurídica,
Contudo, todos estes critérios acabam por ser exigíveis na atribuição da providencia cautelar no caso concreto, permitindo manter uma unidade no sistema, visto o alargamento no âmbito de matérias que as providências cautelares podem agora tutelar, e a que cada vez mais recorrem para tutelar os interesses próprios, tendo-se revelado como um instrumento de fácil acesso.


Mariana Roque, nº18282


Bibliografia:

«O contencioso administrativo no divã da psicanálise», Vasco Pereira da silva;
«A justiça administrativa», José Carlos vieira de Andrade;
«O novo regime do processo nos tribunais administrativos», Mário Aroso de Almeida;
«Manual de Processo administrativo», Mário Aroso de Almeida.




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