Casa da
Música tem de pagar 2,7 milhões a comerciantes
O Tribunal Cível do
Porto condenou a sociedade Casa da Música/Porto 2001 a indemnizar 60
comerciantes da cidade pelos prejuízos causados pelas obras. No total, com
juros, são cerca de 2,7 milhões de euros.
O Tribunal entendeu
haver uma relação de causa-efeito entre o que considerou ser falta de
planeamento e de organização das obras de requalificação urbana da cidade,
levadas a cabo pela então Porto 2001 (atualmente Casa da Música/ Porto 2001,
sociedade anónima de capitais públicos) e os prejuízos de 60 estabelecimentos
comerciais da Baixa.
http://www.jn.pt/paginainicial/pais/concelho.aspx?Distrito=Porto&Concelho=Porto&Option=Interior&content_id=2893470
Apreciação da Competência/Conflito de
Competência
No âmbito desta
notícia pode levantar-se a questão da competência dos Tribunais Judiciais
relativamente à responsabilidade civil extracontratual do Estado. Evidenciando
as partes litigantes, temos como Autor a Associação de Comerciantes do Porto e
como Réu a Sociedade Casa da Música/Porto 2001.
A configuração
da acção pelo Autor (causa de pedir e pedido) determina qual o tribunal
competente para dirimir o litígio. A lei exige que, sempre que um dos sujeitos
da relação jurídica seja uma entidade pública (que detenha poderes de
autoridade conferidos pelo Direito Administrativo) a praticar o facto que
origine o dano, está-se perante uma relação jurídica administrativa[1].
Compete assim (aparentemente), a resolução deste conflito, à jurisdição
administrativa.
Contudo o
sujeito que praticou o acto lesivo – Casa da Música/Porto 2001 - constitui uma
sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos (exterior à
administração). Este factor faz com que, a lei a aplicar seja a comercial e
relativamente a tudo quanto for omisso nos seus estatutos, aplicar-se-á o
regime geral das sociedades anónimas. Estamos a falar de uma pessoa colectiva
de direito privado sujeita ao regime da responsabilidade civil extracontratual
nos termos ditados pelo Código Civil e pelo Código das Sociedades Comerciais. Tendo
em conta o disposto no art. 4º nº1 al. i) do ETAF, a competência dos tribunais
administrativos para se pronunciar sobre acções emergentes de responsabilidade
civil extracontratual de entidades privadas depende da existência de lei
especial que determine que lhes seja aplicável “o Regime específico da
responsabilidade do Estado e demais pessoas colectivas de direito público”.
Todas as acções que não sejam especialmente atribuídas a outras espécies de
Tribunais, cabe aos Tribunais Judiciais julgá-las.
Aos Tribunais
Administrativos cumpre dirimir os litígios relativos a relações jurídicas
administrativas. Podemos assim concluir que, a competência para conhecer o caso
em apreço, de responsabilidade civil extracontratual do Estado (Sociedade Anónima
de capitais exclusivamente públicos), nos termos configurados pelo autor com
vista ao ressarcimento dos danos provocados pelas obras do Porto 2001 (tendo
por base uma acção por prejuízos causados devido à realização de obras
públicas) é dos Tribunais Comuns e não da competência da jurisdição
administrativa[2].
[1] O conceito de relação jurídica administrativa é importante para determinar a repartição de competências entre os Tribunais Judiciais e os Tribunais Administrativos pelo que é necessário definir o que se deve entender por relação jurídica administrativa.
“Considera-se que são administrativas não só as relações estabelecidas entre duas pessoas colectivas públicas ou entre dois órgãos administrativos, desde que não haja indícios claros da sua pertinência ao direito privado, como também aquelas em que um dos sujeitos envolvidos (seja ele público ou privado) actua no exercício de um poder de autoridade tendo em vista a realização de um interesse público legalmente definido e aquelas em que um dos sujeitos actua no cumprimento de deveres administrativos, de autoridade pública, impostos pelo interesse público. Deste modo, o que é essencial e caracteriza a relação jurídica administrativa é o facto de um dos seus sujeitos ser uma entidade pública ou uma entidade a quem foram atribuídos poderes de autoridade para desenvolver o fim público que lhe foi definido e que agem ao abrigo de normas de direito administrativo”. M. Esteves de Oliveira e R. Esteves de Oliveira CPTA Anotado, vol. I, pg. 25 e SS. – Ac. do Tribunal de conflitos. 06/09 de 04-11-2009
[2] “A jurisdição administrativa só será competente para dirimir litígios emergentes de responsabilidade civil extracontratual dos sujeitos privados se lei especial assim o determinar e, porque assim, na ausência dessa lei, os Tribunais dessa jurisdição serão incompetentes para resolver esses litígios, ainda que a pessoa colectiva de direito privado interveniente seja de capitais exclusivamente públicos e esteja incumbida do desempenho de actividades de interesse público.” Acórdão do STA de 25/01/2005 (rec. 681/04).
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