quarta-feira, 12 de dezembro de 2012


As sentenças Administrativas (Efeitos e força)

O artigo 173º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ( a partir de agora CPTA), tem como epígrafe "Dever de execução". Leia-se dever de execução das sentenças de anulação de actos administrativos. De acordo com este artigo a anulação de um acto administrativo obriga a Administração:

i) a reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado;

ii) a dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto que foi anulado;

iii) a praticar actos com eficácia retroactiva.

Nos primórdios do contencioso Administrativo havia a ideia de que o o juiz só poderia anular actos administrativos, mas não poderia dar ordens de qualquer ordem às autoridades administrativas, ideia justificada pelo principio da separação de poderes e por uma visão autoritária do Direito administrativo vinda de França. Apesar de tradicionalmente se falar apenas em sentenças de anulação, por serem as mais frequentes, pode-se dizer que este regime também é aplicável às sentenças declarativas de nulidade ou de inexistência de actos administrativos. Em qualquer dos casos impõe-se à Administração o dever de reconstituir a situação que deveria existir. Para a doutrina mais recente como é o caso do regente da cadeira Vasco Pereira da Silva a admissibilidade de sentenças de condenação da Administração não é contrária a nenhum principio da Justiça Administrativa é sim a demonstração de um Contencioso Administrativo de plena jurisdição. Que permite reagir contra comportamentos administrativos, por acção ou por omissão,  que lesam direitos dos particulares.

Actualmente com a existência de tribunais administrativos, concebidos como autênticos tribunais, decorre necessariamente que as decisões por eles proferidas se devem qualificar como verdadeiras sentenças, revestidas da autoridade de caso julgado. E da circunstância de esses tribunais possuírem jurisdição própria, resulta naturalmente que tais sentenças obrigam só por si, independentemente de toda e qualquer homologação por parte das autoridades administrativas, a Administração a executar as sentenças. Apesar das alterações feitas no contencioso Administrativo ainda existem acções impugnatórias  em que o pedido e a sentença se limitam à anulação de actos administrativos, porque não é obrigatória a cumulação do pedido anulatório com o da reconstituição da situação hipotética, nem com o da condenação à prática do acto devido. 

O processo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos, está feito para dar resposta a situações em que o tribunal proferiu uma verdadeira anulação, permitindo que a própria Administração retire das sentenças as consequências devidas. E por este motivo se diz que é um processo declarativo intentado contra a administração e que funciona como uma via processual específica, instituída para a actuação processual das pretensões complementares em relação à pretensão anulatória. 
Por isso nos casos em que o processo impugnatório tenha sido cumulado  com o pedido de condenação da administração a praticar um acto referido no artigo 173º do CPTA, temos não uma sentença de mera anulação, mas uma sentença condenatória. Por se considerar que este tipo de sentenças do artigo 173º do CPTA são sentenças condenatórias, elas podem constituir um titulo executivo e habilitar o seu titular a instaurar as duas formas de processo executivo previstas nos artigos 162º e seguintes e 170º e seguintes do CPTA, de execução para prestação de facto ou de coisa ou para pagamento de quantia certa, isto no caso de incumprimento por parte da Administração. 

Já para o Professor Vieira de Andrade por exemplo as sentenças de anulação têm um efeito "constitutivo", porque elimina o acto impugnado desde o momento em que se verificou a sua ilegalidade. Têm também um efeito "represtinatório" porque impõem a reconstituição da situação que existiria, se não tivesse sido praticado o acto ilegal ou se o acto tivesse sido praticado sem a ilegalidade, dizendo que há está aqui presente o Princípio da reconstituição da situação hipotética actual. Além deste dois efeitos defende que têm também um efeito "conformativo ou preclusivo (ou inibitório) " isto porque do artigo 173º/1 CPTA resulta o dever de respeito pela Administração do caso julgado, tendo esta que se conformar com o conteúdo da sentença e com as limitações que possam derivar da mesma. Havendo uma proibição de reincidência, da administração praticar um acto idêntico ou com os mesmos vícios que foram condenados pelo juiz, podendo ocorrer novamente em nulidade ou ofensa do caso julgado. Referindo-se a jurisprudência a estes efeitos como "efeitos ultra-constitutivos" da sentença de anulação.  Deste modo a Administração deve conformar-se com a sentença e com os seus limites quando praticar um novo acto. 

O 173º/2 do  CPTA impõe à Administração a prática de actos retroactivos e o dever de remover, reformar ou substituir actos jurídicos e alterar situações situações que entretanto tenham surgido e que possam ser incompatíveis com a execução da sentença, protegendo assim os interesses de quem não intentou a acção e confirmando assim a sentença. Vem também o 173º/3 do CPTA dar uma protecção acrescida aos interessados e a todos aqueles que estejam envolvidos com a anulação do acto, definindo que todos os beneficiários de actos consequentes praticados à mais de um ano que desconheciam sem culpa a precariedade da sua situação têm direito a ser indemnizados pelos danos que sofram em consequência da anulação do acto. Contudo a sua situação jurídica não pode ser posta em causa se esses danos forem de difícil ou impossível reparação e houver desproporção entre a manutenção do seu interesse e da execução da sentença anulatória. 
Deste modo podemos dizer que o dever que Administração tem de pôr a situação de facto de acordo com a situação de direito é desencadeada pela sentença, mas decorre de determinações de direito substantivo e o seu alcance depende dos fundamentos da decisão de anular e da concreta ilegalidade decorrendo de um carácter normativo negativo. Diz-nos assim o artigo 179º/1 do CPTA que o tribunal quando julga procedente a pretensão do autor, especifica o conteúdo dos actos e operações a adoptar para dar execução à sentença e identifica ainda os órgãos administrativos que ficarão responsáveis pela sua adopção, fixando também os prazos em que os actos devem ser praticados. O dever que resulta assim para a Administração é assim o dever de reexaminar a situação de facto à luz da lei aplicável e da sentença. E a sua actuação é diferente conforme o fundamento da anulação judicial proíba ou não a "renovação" do acto e conforme o grau de discricionaridade ou vinculação  administrativa referente ao acto. 

Regra geral é de que as sentenças produzam efeitos só entre as partes mas no no Processo Administrativo existe uma excepção. As sentença de declaração de ilegalidade das normas, quando se trata de uma impugnação abstracta têm força obrigatória geral, não é só a eliminação da norma do ordenamento jurídico que se opõe a todos (mesmo que não tenham sido partes no processo) é a própria ilegalidade do regulamento que se impõe na ordem jurídica objectiva, logo a todos independentemente de serem ou não partes no processo, isto por força do artigo 76º do CPTA. Os efeitos da sentença podem ser ainda pedidos pelas partes  nos termos do 161º do CPTA, ou seja, a sentença pode abranger outras pessoas que se encontrem na mesma situação jurídica sendo os seus casos idênticos mesmo que não estejam dentro do processo. 
Podemos concluir que as sentenças substitutas de actos administrativos são mais uma forma de defesa dos particulares contra a Administração, porque executam actos que primeiramente foram omitidos pela Administração ou porque declaram certos actos ilegais e repõem a situação que hipoteticamente deveria existir e não foi possível devido a actos da Administração.


Bibliografia: 

- Ricardo Branco " As sentenças substitutivas  de actos Administrativos no Contencioso Administrativo" em Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia, volume II, Coimbra Editora 2010
- Vieira de Andrade " A justiça Administrativa (lições)" Almedina 2010
-Vasco Pereira da Silva " O Contencioso administrativo no divâ da psicanálise" Almedina, 2009
- Mário Aroso de Almeida " Manual de Processo Administrativo"  Almedina 2010
- Diogo Freitas do Amaral " Grandes Linhas da reforma do Contencioso Administrativo" , Almedina 2004
- Adão de Almeida "Estudos de Direito Publico- Direito do contencioso Administrativo"


Mónica Padeiro  nº 16959

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