quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Dos Processos Executivos


       Os processos executivos existem para obter do tribunal a adopção das providências que concretizem, no plano dos factos, aquilo que foi juridicamente declarado pelo tribunal no processo declarativo. Ora, os processos declarativos dirigem-se à declaração do direito, à resolução dos litígios através da proclamação, pelo tribunal, da solução que o Direito estabelece para as situações concretas.
            Assim, o processo executivo adequa os factos ao Direito, portanto, a obter a execução do Direito, através da adopção de providências destinadas a colocar a situação do facto existente em conformidade com o Direito que foi declarado: seja através da execução coactiva do título executivo, seja através do constrangimento do obrigado a cumprir o que nele for determinado.
            A pretensão que o exequente dirige ao tribunal sustenta-se num título executivo, que pode ser uma sentença ou outro documento, a que a lei substantiva atribua força executiva (46º CPC).
             O CPTA regula a matéria dos processos executivos nos arts. 157º a 179º. Contudo, o CPTA só regula as execuções promovidas contra entidades públicas, e não contra particulares (157º/1; 157º/3; 157º/4 CPTA). A execução das sentenças proferidas pelos tribunais administrativos contra particulares também ocorre nos tribunais administrativos, mas rege-se pela lei processual civil, não sendo aplicável o regime disposto no CPTA (157º/2 CPTA).
          Visto que, o conceito de “entidades públicas” é ambíguo, o conceito presente no art. 157º/1 CPTA, deve ser interpretado segundo uma concepção teleológica: deve-se alargar o âmbito destas entidades para além do universo das “pessoas colectivas de direito público”, pelo menos às entidades privadas investidas de privilégios de direito público. Deste modo, podem servir de base a um processo executivo a intentar nos tribunais administrativos os elementos previstos nos arts. 157º/1, 157º/2 e 157º/3 CPTA (este último por remissão do art. 45º CPC).
          Os arts. 158º, 159º e 160º CPTA destinam-se à obrigatoriedade das decisões proferidas pelos tribunais administrativos e às consequências que daí resultem. De um modo geral, a vinculação à decisão proferida impõe-se a partir do trânsito em julgado da sentença (160º/1 CPTA).
            Como já referido no meu post anterior (http://ano4subturma2.blogspot.pt/2012/11/dos-recursos-jurisdicionais-disposicoes.html), os recursos têm efeito suspensivo (143º/1 CPTA), em regra. Nos casos em que este, excepcionalmente, tenha efeito meramente devolutivo (143º/2 e 143º/3 CPTA), a obrigatoriedade impõe-se a partir da notificação da própria decisão (110º/4, 111º/3 e 122º/1 CPTA) ou da decisão que tenha atribuído efeito meramente devolutivo ao recurso (160º/2 CPTA).
            No que toca às sanções pelo desrespeito a esta obrigatoriedade, o art. 159º CPTA, estabelece-as no plano da responsabilidade civil das entidades e das responsabilidades civil, disciplinar e criminal de quem nelas desempenhe funções.
            O interessado tem a possibilidade de suscitar esta invalidade dos atos administrativos entretanto praticados.
         O CPTA, no art. 158º/2, dá abrigo às situações em que a Administração para se subtrair ao cumprimento das suas obrigações providas de uma decisão jurisdicional, incorre na tentação de praticar um ato administrativo que pretende impor como fundamento para o seu incumprimento: são nulos os atos administrativos que desrespeitem qualquer decisão dos tribunais administrativos (164º/3, 167º/1, 176º/5, 179º/2 CPTA).
            Assim, o juiz fica com a tarefa de verificar se assim é, e portanto, se esse ato deve ou não ser qualificado como um “ato de inexecução da sentença exequenda”, para o efeito de ser anulado no âmbito do próprio processo de execução: trata-se do princípio de plenitude do processo de execução.
            O CPTA institui três formas de processo executivo (157º1 CPTA), em que a cumulação entre si, não parece possível e, por isso, devem ser deduzidas em processos executivos separados.
            Assim, a primeira forma de processo é a “Execução para prestação de factos ou de coisas” (162º a 169º CPTA) que, deve ser utilizada para obter a execução de prestações (positivas ou negativas) e, por outro lado, para obter execuções que se devem realizar, tanto na realização de operações materiais, como na prática de atos jurídicos (incluindo atos administrativos e regulamentos).
         O CPTA supera o preconceito da infungibilidade de todas as prestações a cargo da Administração: quando se trata de proceder à realização de atos materiais (e não de atos administrativos), estamos perante condutas fungíveis, que podem ser praticadas por outrem, que não a entidade obrigada (por exemplo, 167º/5 CPTA).
            Porém, a fungibilidade não existe, apenas quando se trata de praticar operações materiais, mas também quando se trate de atos administrativos inteiramente vinculados (167º/6 CPTA).
Assim, quando se trate do cumprimento de obrigações que sejam efetivamente infungíveis, o art. 168º CPTA institui a imposição de sanções pecuniárias compulsórias como o instrumento através do qual se deve procurar obter, no âmbito dos processos de execução para prestação de facto (vide 169º/1 CPTA).
          Tal sucede-se, uma vez que, nos domínios de infungibilidade, não é possível a adopção de providências capazes de proporcionar ao credor a satisfação do seu direito, prescindindo do cumprimento por parte do obrigado (a satisfação dos direitos só pode ser obtida através da imposição de medidas de coação; as sanções pecuniárias compulsórias não são uma medida estruturalmente executiva): a satisfação dos direitos só pode ser obtida através da imposição de medidas de coação (ditas de execução indireta), destinadas a coagir o obrigado ao cumprimento. Será o caso da emissão de atos administrativos não vinculados ou da emanação de normas regulamentares.
          O CPTA admite o reconhecimento de que a execução não é possível ou seria gravemente prejudicial para o interesse público e, por via disso, estabelece a fixação de uma indemnização destinada a compensar o exequente por esse facto (163º, 166º/1 e 166º/3 CPTA).
            O Código consagra assim, a figura das causas legítimas de inexecução – indemnização, essa, que não parece cobrir a reparação de todos os danos que possam ter resultado da atuação ilegítima da Administração, que sempre poderá ser objecto de ação autónoma.
            O exequente é, assim, admitido a requerer as providências executivas capazes de satisfazer o seu direito, que só poderão ser recusadas quando, em oposição à execução que o juiz venha a julgar procedente, seja invocada a superveniente extinção do direito ou a superveniência de obstáculos que impeçam à adopção de tais providências (163º/3 e 165º CPTA).
              O preceito do art. 166º CPTA institui, assim, um processo declarativo especial autónomo, para obter a fixação do montante da indemnização devida quando as partes concordem quanto à existência de causa legítima de inexecução, mas não cheguem a acordo no que se refere à determinação do montante a pagar.
            A segunda forma de processo trata-se da “Execução para pagamento de quantia certa” (170º a 172º CPTA), que deve ser utilizada para obter a execução de obrigações que se consubstanciem no pagamento de quantias em dinheiro.
            Neste caso, não há lugar para indagações sobre a existência de causa legítimas de execução: a lei assume que o pagamento de quantias em dinheiro por parte de entidades públicas é sempre possível e nunca implica grave lesão de interesses públicos. Significa isto que, no caso de a entidade obrigada não ter dinheiro para pagar, avança-se para a execução.
            O art. 172º CPTA prevê dois tipos específicos de providências de execução: a compensação do crédito do exequente (170º/2/a e 172º/2 CPTA) e a sub-rogação do crédito por parte do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (170º/2/b e 172º/3 CPTA). O art. 172º CPTA configura este instrumento em termos de utilização prioritária, só admitindo a título subsidiário a aplicação do 172º/8 CPTA no caso do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais se vir impossibilitado de prestar a verba, caso em que, seria aplicável a lei processual civil.
            A terceira e última forma de processo é a de “Execução de sentenças de anulação de atos administrativos” (173º a 179º CPTA). O interessado que impugne um ato administrativo ilegal, pedindo a sua anulação, a declaração de nulidade ou inexistência, pode optar por proceder apenas à impugnação do ato, deixando para momento ulterior à decisão do processo impugnatório a eventual atuação processual das pretensões complementares em relação à pretensão impugnatória, que, embora o pudessem ter sido, não tenham sido cumuladas no processo impugnatório e se dirijam ao cumprimento do dever que à Administração se impõe de extrair as devidas consequências que deu provimento ao processo impugnatório: dever de executar a sentença de anulação (173º, 174º e 175º CPTA), por isso, o CPTA optou por dar o nome de processo de execução de sentenças de anulação de atos administrativos.
            Como claramente resulta do art. 176º/1 CPTA, este processo de execução só deve ser utilizado quando a Administração não observe o disposto nos arts. 173º a 175º, não dando, assim, cumprimento ao dever de executar que se lhe impõe.
            Como resulta do art. 173º/1 CPTA, os deveres em que a Administração pode ficar constituída na sequência da procedência do processo impugnatório de um ato administrativo podem situar-se em três planos:
·                     * reconstituição da situação que existiria se o ato ilegal não tivesse sido praticado;
·                     * cumprimento tardio dos deveres que a Administração não cumpriu durante a vigência do ato ilegal,         
·                     * eventual substituição do ato ilegal, sem reincidir nas ilegalidades anteriormente cometidas.
O processo de execução de sentenças de anulação de atos administrativos foi concebido para dar resposta a situações em que o tribunal proferiu uma pura anulação, deixando que a Administração se encarregue de extrair da sentença as devidas consequências. No entanto, nos casos em que, tenha sido desde logo cumulado o pedido de condenação da Administração a extrair da anulação, é evidente que, a sentença não será de mera anulação mas sim de condenação.
O processo de execução de sentenças de anulação de atos administrativos caracteriza-se por uma necessária fase declarativa (arts. 173º a 175º; 176º/1 e 3; 177º/1 e 2; 179º/1 e 3 CPTA), e se for caso disso, uma eventual fase executiva (179º CPTA). Começa-se por identificar o conteúdo dos deveres em que a Administração ficou constituída por efeito da sentença e proceder à condenação da Administração ao cumprimento desses deveres, no âmbito de um litígio entre as partes. A segunda fase, sendo eventual, já se destina a proporcionar ao interessado o resultado pretendido, em fase executiva, na eventualidade da Administração não ter cumprido os deveres que lhe foram impostos na fase declarativa.
Este tipo de execução, pode também terminar com o reconhecimento da existência de uma causa legítima de inexecução, por impossibilidade ou grave lesão do interesse público, e na fixação de uma indemnização destinada a compensar o interessado, podendo seguir-se a conversão do processo num processo de execução para pagamento de quantia certa, no caso de a Administração não proceder ao pagamento da indemnização devida (176º/6 e 7; 178º CPTA).
A instauração do processo de execução de sentença pressupõe o incumprimento destas obrigações, pelo que só pode ser intentado, nos termos do art. 176º CPTA, após o decurso dos respetivos prazos: se a entidade obrigada não der, portanto, espontâneo cumprimento, dentro do prazo de que dispõe para o efeito, aos deveres que lhe incumbem, o exequente pode pedir a execução judicial (176º/1 CPTA).


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