terça-feira, 27 de novembro de 2012


O Ministério Público no Novo Contencioso Administrativo

                O Ministério Público actualmente desempenha as suas funções nos tribunais administrativos, nos termos do artigo 51º do ETAF, sendo que dentro da sua competência representa o Estado, defende a legalidade democrática e promove a realização do interesse público. Quando propõe acções no exercício da chamada acção pública, este pode ser autor de processos administrativos (artigo 9º, nº2 do CPTA). Como prevê o artigo 11º, nº2, as acções administrativas comuns que sejam propostas contra o Estado em matéria de responsabilidade civil ou respeitante a contratos, o Ministério Público representa o Estado. Resulta ainda da formulação restritiva do artigo 51º do ETAF que ao Ministério Público não incumbe representar outra entidade, que não o Estado. Pode ainda intervir nos processos administrativos em que não seja parte e que sigam a forma administrativa especial, nos termos do artigo 85º. A previsão do artigo 85º é o que resta dos amplos poderes de intervenção que, no regime precedente, eram reconhecidos ao Ministério Público nos processos em que não era parte, sendo que, hoje em dia, a intervenção não é obrigatória nem ocorre mais de uma vez em cada processo, ou seja, tem lugar uma única vez, e só quando o Ministério Público o considere que ela se justifica, em função da relevância da matéria em causa. Por último o Ministério tem ainda intervenção no âmbito dos recursos jurisdicionais que não tenha interposto.
                 No anterior sistema processual o Ministério Público dispunha de um amplo poder de intervenção que ia desde a defesa da legalidade, mediante recurso contencioso de anulação, até à representação do Estado em juízo. A intervenção centrava-se essencialmente no patrocínio em sede de contencioso do Estado, na actividade processual de carácter instrutório e no parecer final (obrigatório). Deste modo, na acção pública administrativa a sua actuação era reduzida.
                No sistema actual e com a reforma do contencioso administrativo, o modelo de intervenção do Ministério Público foi alterado, sendo que ao nível processual a sua intervenção está agora limitada e tem uma natureza interlocutória. Nos termos do artigo 85º, do CPTA tem um momento processual próprio para intervir, preclusivo, que não pode ultrapassar o prazo de 10 dias após a notificação da junção aos autos do processo administrativo, o chamado processo instrutor, ou da apresentação das contestações. Pode requerer a realização de diligências instrutórias e dar um parecer sobre o mérito da causa, mas apenas em defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, de interesses públicos especialmente relevantes, ou de valores ou bens constitucionalmente protegidos, nos termos do artigo 9º, nº 2, do CPTA (como referido anteriormente).
A possibilidade de intervir no processo em termos instrutórios ou acessórios está agora limitada, isto se comparada com o anterior regime, mas não é menos certo que a representação do Estado aumentou de uma forma tal que os recursos humanos de que o Ministério Público dispõe só lhe permitem uma intervenção processual mínima e tornam mesmo muito residual o exercício das suas competências em sede de acção pública administrativa.
A intervenção do Ministério Público na jurisdição administrativa e fiscal está subordinada ao estabelecido no artigo 219.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e as atribuições que exerce não são mais do que concretizações e especialidades dessa modelação geral de base constitucional.
O novo modelo configura um equilíbrio entre, por um lado, o recorte constitucional e estatutário dos poderes de iniciativa e intervenção processuais do Ministério Público, e, por outro, do respectivo enquadramento num sistema de justiça administrativa que se apresenta hoje, no plano constitucional, marcadamente subjectivista – desde logo por ser esta a dimensão que surge constitucionalmente configurada como um imperativo.
De facto, a dimensão subjectivista da justiça administrativa vertida no artigo 268.º da C.R.P., foi a razão invocada para a reconfiguração dos poderes processuais do Ministério Público.
Seja qual for o entendimento preconizado sobre os poderes processuais do Ministério Público, a reforma operada não podia, obviamente, esvaziar a função de representação em juízo do Estado, por tal ir contra a consagração constitucional dessa competência.
No âmbito das acções administrativas especiais da iniciativa dos particulares (em que o Ministério Público não é parte formal) o CPTA reequacionou a intervenção processual do Ministério Público na acção impugnatória quanto ao tipo de intervenção, quanto ao conteúdo dessa intervenção (artigo 85.º, n.º 2 a 4 e quanto ao momento em que deverá ser concretizada ( n.º 5).
Ao Ministério Público e aos titulares de interesse directo na anulação do acto, mantém-se um conceito muito vasto de legitimidade para a impugnação de actos, e até se alarga a pessoas e aos órgãos administrativos, bem como, no âmbito da acção popular, a qualquer cidadão e a titulares de interesses difusos, incluindo as autarquias (artigos 55º, n.º 1, alínea a), 9º, nº 2 e 40º, do CPTA).
Em suma, o Ministério Público continua a deter no novo contencioso importantes poderes de iniciativa e intervenção processuais para defesa da legalidade, do interesse público e de bens comunitários ou valores socialmente relevantes, como a saúde pública, o ambiente, o urbanismo, o ordenamento do território, a qualidade de vida, o património cultural e os bens do Estado, das Regiões Autónomas e das autarquias locais.



Bibliografia:

ALMEIDA, Mário Aroso, "Manual de Processo Administrativo", Almedina, Coimbra, 2012;


Elaborado por:

Vanessa Jacinto
Nº 17814

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