O Ministério Público no
Novo Contencioso Administrativo
O Ministério Público actualmente desempenha as suas
funções nos tribunais administrativos, nos termos do artigo 51º do ETAF, sendo
que dentro da sua competência representa o Estado, defende a legalidade
democrática e promove a realização do interesse público. Quando propõe acções
no exercício da chamada acção pública, este pode ser autor de processos
administrativos (artigo 9º, nº2 do CPTA). Como prevê o artigo 11º, nº2, as
acções administrativas comuns que sejam propostas contra o Estado em matéria de
responsabilidade civil ou respeitante a contratos, o Ministério Público
representa o Estado. Resulta ainda da formulação restritiva do artigo 51º do
ETAF que ao Ministério Público não incumbe representar outra entidade, que não
o Estado. Pode ainda intervir nos processos administrativos em que não seja
parte e que sigam a forma administrativa especial, nos termos do artigo 85º. A
previsão do artigo 85º é o que resta dos amplos poderes de intervenção que, no
regime precedente, eram reconhecidos ao Ministério Público nos processos em que
não era parte, sendo que, hoje em dia, a intervenção não é obrigatória nem
ocorre mais de uma vez em cada processo, ou seja, tem lugar uma única vez, e só
quando o Ministério Público o considere que ela se justifica, em função da
relevância da matéria em causa. Por último o Ministério tem ainda intervenção
no âmbito dos recursos jurisdicionais que não tenha interposto.
No anterior
sistema processual o Ministério Público dispunha de um amplo poder de
intervenção que ia desde a defesa da legalidade, mediante recurso contencioso
de anulação, até à representação do Estado em juízo. A intervenção centrava-se
essencialmente no patrocínio em sede de contencioso do Estado, na actividade
processual de carácter instrutório e no parecer final (obrigatório). Deste
modo, na acção pública administrativa a sua actuação era reduzida.
No sistema actual e com a reforma do contencioso
administrativo, o modelo de intervenção do Ministério Público foi alterado,
sendo que ao nível processual a sua intervenção está agora limitada e tem uma
natureza interlocutória. Nos termos do artigo 85º, do CPTA tem um momento
processual próprio para intervir, preclusivo, que não pode ultrapassar o prazo de
10 dias após a notificação da junção aos autos do processo administrativo, o
chamado processo instrutor, ou da apresentação das contestações. Pode requerer
a realização de diligências instrutórias e dar um parecer sobre o mérito da
causa, mas apenas em defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, de
interesses públicos especialmente relevantes, ou de valores ou bens
constitucionalmente protegidos, nos termos do artigo 9º, nº 2, do CPTA (como
referido anteriormente).
A
possibilidade de intervir no processo em termos instrutórios ou acessórios está
agora limitada, isto se comparada com o anterior regime, mas não é menos certo
que a representação do Estado aumentou de uma forma tal que os recursos humanos
de que o Ministério Público dispõe só lhe permitem uma intervenção processual
mínima e tornam mesmo muito residual o exercício das suas competências em sede
de acção pública administrativa.
A
intervenção do Ministério Público na jurisdição administrativa e fiscal está
subordinada ao estabelecido no artigo 219.º da Constituição da República
Portuguesa (CRP) e as atribuições que exerce não são mais do que concretizações
e especialidades dessa modelação geral de base constitucional.
O
novo modelo configura um equilíbrio entre, por um lado, o recorte constitucional
e estatutário dos poderes de iniciativa e intervenção processuais do Ministério
Público, e, por outro, do respectivo enquadramento num sistema de justiça
administrativa que se apresenta hoje, no plano constitucional, marcadamente
subjectivista – desde logo por ser esta a dimensão que surge
constitucionalmente configurada como um imperativo.
De
facto, a dimensão subjectivista da justiça administrativa vertida no artigo
268.º da C.R.P., foi a razão invocada para a reconfiguração dos poderes
processuais do Ministério Público.
Seja
qual for o entendimento preconizado sobre os poderes processuais do Ministério
Público, a reforma operada não podia, obviamente, esvaziar a função de
representação em juízo do Estado, por tal ir contra a consagração constitucional
dessa competência.
No
âmbito das acções administrativas especiais da iniciativa dos particulares (em
que o Ministério Público não é parte formal) o CPTA reequacionou a intervenção
processual do Ministério Público na acção impugnatória quanto ao tipo de
intervenção, quanto ao conteúdo dessa intervenção (artigo 85.º, n.º 2 a 4 e
quanto ao momento em que deverá ser concretizada ( n.º 5).
Ao
Ministério Público e aos titulares de interesse directo na anulação do acto,
mantém-se um conceito muito vasto de legitimidade para a impugnação de actos, e
até se alarga a pessoas e aos órgãos administrativos, bem como, no âmbito da
acção popular, a qualquer cidadão e a titulares de interesses difusos,
incluindo as autarquias (artigos 55º, n.º 1, alínea a), 9º, nº 2 e 40º, do
CPTA).
Em
suma, o Ministério Público continua a deter no novo contencioso importantes
poderes de iniciativa e intervenção processuais para defesa da legalidade, do
interesse público e de bens comunitários ou valores socialmente relevantes,
como a saúde pública, o ambiente, o urbanismo, o ordenamento do território, a
qualidade de vida, o património cultural e os bens do Estado, das Regiões
Autónomas e das autarquias locais.
Bibliografia:
ALMEIDA, Mário Aroso,
"Manual de Processo Administrativo", Almedina, Coimbra, 2012;
Elaborado por:
Vanessa Jacinto
Nº 17814
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