No presente texto pretende-se elaborar uma breve análise de uma matéria específica, no âmbito da legitimidade activa: a legitimidade para defesa de interesses difusos.
O artigo 9.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) reconhece a qualquer pessoa, às associações e fundações defensoras dos interesses em causa, às autarquias locais e ao Ministério Público, a legitimidade para propor e intervir em processos principais e cautelares para defesa dos valores e bens constitucionalmente protegidos. Estabelece-se, assim, uma extensão da legitimidade.
No artigo 52.º, n.º3 da Constituição da República Portuguesa (CRP) encontramos dois tipos de acções populares: uma para tutela da legalidade objectiva e outra para defesa de interesses difusos. A primeira, chamada acção popular clássica, tinha como objectivo a reposição da legalidade violada pelos comportamentos lesivos de autoridades públicas. A evolução determinou um alargamento subjectivo dos proponentes. No entanto, é sobre a segunda que se pretende elaborar a referida análise.
Como refere o Prof. Mário Aroso de Almeida, o preceito tem em vista o exercício do direito de acção popular (artigo 2.º da Lei n.º 83/95 e artigo 52.º, n.º3 da CRP). Esta tem por objectivo a defesa de bens públicos e colectivos, ou seja, a tutela de interesses difusos. É de referir que a acção popular não constitui uma forma de processo (não é um meio processual especifico).
Os interesses difusos encontram-se previstos na alínea a) do n.º3 do artigo 52.º da CRP (saúde pública, os direitos dos consumidores, a qualidade de vida, a preservação do ambiente e do património cultural) e no n.º2 do artigo 9.º do CPTA e n.º2 do artigo 1.º da Lei 83/95 (urbanismo, ordenamento do território e o domínio público). É de notar que a última alusão a bens e valores constitucionalmente protegidos é feita a título meramente exemplificativo ("como", "designadamente"), podendo existir outros bens e valores dessa natureza.
A maioria da doutrina considera que estes interesses difusos são interesses supra individuais, insusceptíveis de apropriação individual: são bens de toda a comunidade, que usufrui deles e pretende preservá-los, sendo também bens individuais uma vez que pertencem a cada individuo dessa mesma comunidade. São direitos que pertencem "a todos em geral e a ninguém em particular"(1).
O Prof. Vasco Pereira da Silva distancia-se deste entendimento, opondo-se à distinção entre direitos subjectivos, interesses legítimos e interesses difusos. O Prof. considera que esta distinção colide com os valores do Estado de Direito Democrático e, por isso, defende a existência de uma categoria de direitos, os direitos subjectivos, onde se incluem todas as posições de vantagens dos privados perante a Administração. Considerando que há posições substantivas de vantagem, as diferenças existentes entre as três categorias são apenas de conteúdo e não de natureza.
A expressão utilizada no artigo 9.º, n.º2, "independentemente", é alvo de divergências na doutrina. Alguns interpretam a expressão no sentido de permitir o recurso à acção popular apenas quando não se verifique a existência de um interesse particular ou pessoal na demanda. Outros consideram ser possível o recurso a esta acção, mesmo que se verifique um interesse pessoal, desde que ainda estejam em jogo interesses difusos.
Assim, a acção popular permite a a participação directa do cidadão na condução da política do Estado.
Bibliografia:
FREITAS DO AMARAL/ MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, "Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo"
MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, "Manual de Processo Administrativo"
VASCO PEREIRA DA SILVA, "O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise"
Trabalho realizado por Fabiana Pereira, n.º19599
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