quarta-feira, 28 de novembro de 2012


Procedimento Administrativo vs Processo Administrativo, art. 1º CPA

O art. 1º do CPA pretende ser esclarecedor e elucidativo na contraposição dos conceitos em análise.
            Na presente exposição pretende-se aprofundar um pouco mais este duo que se complementa.
            Por “procedimento administrativo” e no âmbito da consagração de regras relativas ao mesmo, é de referir o importante papel que este desempenha dentro do controlo interno da administração, como garante de justiça e do bom funcionamento da Administração.
Inicialmente, no direito administrativo, havia uma preocupação concentrada apenas no preenchimento, pela administração, de requisitos relativos à sua conduta, descurando o processo compreendido até à sua adopção e execução. Considerava-se que estas matérias estavam submetidas à reserva da administração, posição fortalecida pelo princípio da legalidade, na medida em que eram da esfera interna da administração.
Actualmente, acompanhada pelas evoluções verificadas quanto ao princípio da legalidade, crê-se que tão importante como a decisão, são os actos que a precedem e se lhe seguem, que a emitem e a executam.
A importância destas fases anteriores e posteriores à decisão, e portanto de toda a globalidade relacionada com a produção decisória administrativa, levaram à consagração legal dos modos de emissão e execução como consagração do principio da participação e como garantia do principio da legalidade, da prossecução do interesse publico, do principio do respeito pelas posições jurídicas dos particulares e demais princípios fundamentais da actividade administrativa.
Assiste-se por isto à procedimentalização do procedimento administrativo previsto na lei. Complementar à definição fornecido no art. 1º/1 CPA surge por isso a noção de procedimento administrativo como o conjunto das condutas dotadas de lógica interna e que visam a produção enquanto procedimento decisório ou a execução enquanto procedimento executivo de uma decisão administrativa. Os actos da administração podem então surgir num momento final da prática decisória, podem acontecer no decorrer de um procedimento que visa apenas a prática de outro acto, ou ainda verificarem-se durante um procedimento que pretende executar actos anteriormente praticados.
A procedimentalização da actividade administrativa é hoje quase total, sendo a regra a da existência de procedimentos que antecedam ou executem os regulamentos, actos ou contratos da administração. Neste sentido, a procedimentalização da administração reduz ou elimina a autonomia pública em matérias de negócios jurídicos, implicando a sua subordinação ao direito diferente da revelada nas relações entre privados.
A importância prática do procedimento reflecte-se desta forma na capacidade que a administração terá de confirmar e estudar dos factos e direitos relevantes, através de diligencias próprias, que garantem o principio da imparcialidade, uma vez que só o procedimento permite a identificação dos interesses envolvidos, públicos e privados, relevantes para a decisão. A procedimentalização da decisão veio também a relevar no sentido de impor requisitos de legalidade aos actos da administração que, não se verificando, implicam determinadas sanções.

Por seu lado, o “processo administrativo” consiste na tradução física dos actos e formalidades que, em regra, constituem um “conjunto de papéis agrupados em dossier ou maço”, no dizer de Rui Machete.
Por processo administrativo pretende-se propriamente a ordem ou sequência das coisas, para que cada uma delas surja em momento oportuno, ditando a evolução a ser prosseguida no procedimento.
Em sentido amplo, “processo” integra o conjunto dos princípios e regras jurídicas, instituído para que se administre a justiça. Pretende organizar as bases da organização judiciária e competência dos juízes, estabelecer a direcção dos procedimentos judicias, no geral, determinar as regras necessárias à administração da justiça. No sentido estrito, por “processo” tem-se o conjunto de actos que devem ser executados na ordem prevista, para que se averigúe e se atenda à pretensão submetida à tutela jurídica. Apenas extensivamente se denomina por “processo” o conjunto dos autos, papéis ou documentos em que se materializam os actos que dão procedência e cumprimento ao processo.
No entanto, já “processo administrativo” é a denominação dada ao processo que se realiza perante a autoridade, administrativa ou judiciária, quando não é de natureza contenciosa ou de iniciativa dela; ao passo que por “processo contencioso” determina todo o processo em que procede a uma discussão entre as partes, que culmina numa decisão ou julgamento que solucione ou ponha fim à contenda.
Em que sentido se pretende então desvendar o art. 1º/2 do CPA?
Atendendo à letra do artigo, bem como ao intuito processual administrativo e inerentes princípios, na conjugação dos sentidos possíveis, crê-se que o “processo administrativo” previsto no artigo se pretende mais do que a previsão rígida do conjunto de materiais que se traduzem nos actos e formalidade que integram o procedimento administrativo. Mais do que isto, considera-se que não só processo administrativo será este conjunto, por menção extensiva, mas que o próprio conjunto se encontra imbuído da noção ampla de processo e, num sentido superior de obrigatoriedade, do seu sentido estrito, em sede da administração. Afastando o conceito previsto para “ processo administrativo” dada a sua noção fraca e, de certa forma, incompleta, aproximamo-nos da noção de “processo contencioso”, ainda que esta esteja mais próxima do que se pretende elucidar no que diz respeito ao procedimento.

Ainda que se possam confundir, no âmbito da linguística ou da própria densidade administrativa, estes dois conceitos apresentam-se distintos mas eventualmente complementares, necessários à compreensão um do outro e seus correspondentes envolvimentos.

Margarida Valadão, 18244

Bibliografia: Direito Administrativo Geral, Tomo III – Prof. Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos; Código do Procedimento Administrativo Anotado e Comentado – José Manuel Santos Botelho, Américo Pires Esteves, José Cândido de Pinho; Vocabulário Jurídico – Plácido e Silva

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