quarta-feira, 28 de novembro de 2012



A efectividade enquanto requisito qualitativo das funções da jurisdição administrativa


No sistema saído da Reforma de 2002/2003, a funcionalização da jurisdição administrativa à tutela das situações jurídicas individuais, à tutela de interesses individuais qualificados e ao controlo jurídico objectivo das formas típicas de conduta administrativa caracteriza-se em conjunto por uma exigência de efectividade. Na constituição, esta exigência surge formalmente associada à garantia de tutela jurisdicional administrativa de direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos tendo de se atender ao disposto nos arts.268º/4 e 20º/5.
Mas uma análise sistemática mostra que a directriz da efectividade deve ser entendida como abrangendo também outras funções que para a jurisdição administrativa nos chegam da constituição, ou seja, a função de tutela de interesses meta individuais materialmente qualificados e a função de controlo jurídico objectivo. A partir do momento em que se extrai dos textos o sentido da injunção de efectividade, torna-se fácil compreender que esta não se pode deixar de estender-se à jurisdição administrativa no seu conjunto, independentemente da finalidade que com esta em cada caso se prossiga.
Das formulações que o CPTA apresenta, pode extrair-se um quadro sintético do conteúdo da efectividade. Em primeiro lugar, ela significa que se poderá obter dentro de um prazo razoável uma pronúncia com força de caso julgado, este significado está presente no nº1 do art.2º do CPTA. Em segundo lugar, tal pronúncia devera ser de mérito sempre que quaisquer irregularidades processuais o não impeçam de forma absoluta, e isto retiramos do disposto no art. 7º e do art.2º/1 CPTA. Em terceiro lugar, a pronúncia de mérito deverá adequar-se estruturalmente ao tipo de situação subjectiva ou de interesse meta individual ou público protegido pelo exercício da jurisdição, tal como dispõem os arts.º2/2 e 9º/2 CPTA. Em quarto lugar, deverá assegurar-se um efeito útil à decisão de mérito graças à neutralização do periculum in mora, tendo de se atender ao disposto nos arts.2º/1, 112º/1, e 120º/1 alíneas b) e c) CPTA. Por fim, existirá a susceptibilidade de concretizar jurídica e materialmente a pretensão provida pela pronúncia de mérito, importa atender ao disposto nos arts.2º/1 e, 3º/2 e 3, 167º a 169º, 172º e 179º do CPTA. A concretização deste imperativo beneficia do contributo instrumental do poder jurisdicional de decretação de sanções pecuniárias compulsórias, reconhecido genericamente no art.º3/2 do CPTA e relembrado em numerosas outras passagens deste diploma a propósito de situações em que haja a Administração de cumprir, dentro de certo prazo, as injunções que o juiz lhe dirija.
Na pretensão de que seja proferida pronúncia de mérito sempre que as irregularidades processuais o não impeçam absolutamente, alberga-se o núcleo de um subprincípio da efectividade, que é o princípio da promoção do acesso á justiça, principio pro actione ou princípio da primazia da justiça material sobre a justiça formal. Em última análise, a efectividade significa que o acesso à jurisdição administrativa deverá revestir-se de aptidão para proporcionar ao sujeito de direito a situação jurídica administrativa que deveria ocorrer no quadro do Direito aplicável ou, em caso de impossibilidade material de tal concretização ou de ela envolver desmesurado prejuízo para o interesse público, uma justa prestação indemnizatória. A efectividade significa, pois, a materialidade da garantia. E esta tem como corolário a prevalência da justiça material sobre a justiça meramente formal, ou seja, em detrimento de um processo que se desenvolva apenas em torno das questões suscitadas à luz das regras adjectivas e formais, sem que acabe por ser dirimida a questão substantiva controvertida. A prevalecia da justiça material significa a desvalorização das exigências processuais que não constituam requisito inafastável do conteúdo essencial de outros princípios fundamentais do processo, como os do contraditório, da igualdade de armas e do juiz natural, ou não representem a insubstituível defesa contra lesão intolerável do valor segurança.
A exigência que incidiu sobre o legislador do CPTA para assegurar a materialidade da justiça era de cariz constitucional, se esta não fosse respeitada e ao invés este diploma conferisse de forma desproporcionada efeitos preclusivos á inobservância de regras formais a cominação só poderia ser a de inconstitucionalidade dessas mesmas normas. Para além disso o legislador consagrou essa directiva constitucional sobre o juiz no art.7º do CPTA, um princípio de interpretação das normas processuais no sentido de estas promoverem sempre que possível pronuncias sobre o mérito da causa, ou seja, o juiz deverá aplicar o sentido, de entre os vários sentidos possíveis existentes na letra processual, aquele que permita atingir o termo do processo com uma pronuncia de mérito.

Bibliografia: CORREIA, J. M. Sérvulo, - “Direito do contencioso administrativo” Lisboa, LEX, 2005;

Pedro Guilherme Campagnac
Aluno-18345

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