A efectividade enquanto requisito qualitativo das funções da jurisdição administrativa
No sistema
saído da Reforma de 2002/2003, a funcionalização da jurisdição administrativa à
tutela das situações jurídicas individuais, à tutela de interesses individuais
qualificados e ao controlo jurídico objectivo das formas típicas de conduta
administrativa caracteriza-se em conjunto por uma exigência de efectividade. Na constituição, esta
exigência surge formalmente associada à garantia de tutela jurisdicional
administrativa de direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos tendo
de se atender ao disposto nos arts.268º/4 e 20º/5.
Mas uma análise
sistemática mostra que a directriz da efectividade deve ser entendida como
abrangendo também outras funções que para a jurisdição administrativa nos
chegam da constituição, ou seja, a função de tutela de interesses meta
individuais materialmente qualificados e a função de controlo jurídico
objectivo. A partir do momento em que se extrai dos textos o sentido da
injunção de efectividade, torna-se fácil compreender que esta não se pode
deixar de estender-se à jurisdição administrativa no seu conjunto,
independentemente da finalidade que com esta em cada caso se prossiga.
Das
formulações que o CPTA apresenta, pode extrair-se um quadro sintético do
conteúdo da efectividade. Em primeiro lugar, ela significa que se poderá obter
dentro de um prazo razoável uma pronúncia com força de caso julgado, este
significado está presente no nº1 do art.2º do CPTA. Em segundo lugar, tal pronúncia
devera ser de mérito sempre que quaisquer irregularidades processuais o não
impeçam de forma absoluta, e isto retiramos do disposto no art. 7º e do art.2º/1
CPTA. Em terceiro lugar, a pronúncia de mérito deverá adequar-se
estruturalmente ao tipo de situação subjectiva ou de interesse meta individual
ou público protegido pelo exercício da jurisdição, tal como dispõem os
arts.º2/2 e 9º/2 CPTA. Em quarto lugar, deverá assegurar-se um efeito útil à
decisão de mérito graças à neutralização do periculum
in mora, tendo de se atender ao disposto nos arts.2º/1, 112º/1, e 120º/1
alíneas b) e c) CPTA. Por fim, existirá a susceptibilidade de concretizar
jurídica e materialmente a pretensão provida pela pronúncia de mérito, importa
atender ao disposto nos arts.2º/1 e, 3º/2 e 3, 167º a 169º, 172º e 179º do CPTA.
A concretização deste imperativo beneficia do contributo instrumental do poder
jurisdicional de decretação de sanções pecuniárias compulsórias, reconhecido
genericamente no art.º3/2 do CPTA e relembrado em numerosas outras passagens
deste diploma a propósito de situações em que haja a Administração de cumprir,
dentro de certo prazo, as injunções que o juiz lhe dirija.
Na pretensão
de que seja proferida pronúncia de mérito sempre que as irregularidades
processuais o não impeçam absolutamente, alberga-se o núcleo de um subprincípio
da efectividade, que é o princípio da promoção do acesso á justiça, principio pro actione ou princípio da
primazia da justiça material sobre a justiça formal. Em última análise, a
efectividade significa que o acesso à jurisdição administrativa deverá
revestir-se de aptidão para proporcionar ao sujeito de direito a situação
jurídica administrativa que deveria ocorrer no quadro do Direito aplicável ou,
em caso de impossibilidade material de tal concretização ou de ela envolver
desmesurado prejuízo para o interesse público, uma justa prestação
indemnizatória. A efectividade significa, pois, a materialidade da garantia. E
esta tem como corolário a prevalência da justiça material sobre a justiça
meramente formal, ou seja, em detrimento de um processo que se desenvolva
apenas em torno das questões suscitadas à luz das regras adjectivas e formais,
sem que acabe por ser dirimida a questão substantiva controvertida. A prevalecia
da justiça material significa a desvalorização das exigências processuais que
não constituam requisito inafastável do conteúdo essencial de outros princípios
fundamentais do processo, como os do contraditório, da igualdade de armas e do
juiz natural, ou não representem a insubstituível defesa contra lesão
intolerável do valor segurança.
A exigência
que incidiu sobre o legislador do CPTA para assegurar a materialidade da
justiça era de cariz constitucional, se esta não fosse respeitada e ao invés
este diploma conferisse de forma desproporcionada efeitos preclusivos á
inobservância de regras formais a cominação só poderia ser a de
inconstitucionalidade dessas mesmas normas. Para além disso o legislador
consagrou essa directiva constitucional sobre o juiz no art.7º do CPTA, um princípio
de interpretação das normas processuais no sentido de estas promoverem sempre
que possível pronuncias sobre o mérito da causa, ou seja, o juiz deverá aplicar
o sentido, de entre os vários sentidos possíveis existentes na letra
processual, aquele que permita atingir o termo do processo com uma pronuncia de
mérito.
Bibliografia: CORREIA, J. M. Sérvulo, - “Direito do contencioso
administrativo” Lisboa, LEX, 2005;
Pedro
Guilherme Campagnac
Aluno-18345
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