Enquadramento
A construção de
três barragens (Gouvães, Alto Tâmega e Daivões) foi suspensa devido a
uma providência cautelar interposta pela Quercus (Organização não governamental
do Ambiente) contra o Ministério do Ambiente. Pretendia-se com a mesma anular a
Declaração de Impacto Ambiental (doravante, DIA), favorável à sua construção.
Como fundamentos de tal ação são apontados a destruição paisagística, a
violação da água e de espécie animal e o prejuízo no desenvolvimento
socioeconómico, entre outras.
Neste sentido,
o Tribunal Administrativo de Lisboa deu a ação como improcedente, ao contrário
do Tribunal Central Administrativo Sul, que considerou esta decisão nula por
erro de julgamento.
Esta
construção foi adjudicada à empresa Iberdrola, representando um investimento de
1 700 milhões de euros e faz parte do Plano Nacional de Investimentos.
Análise
Começando
pela verificação do âmbito de jurisdição deste caso, estamos perante uma
relação jurídica administrativa (artigo 1.º ETAF + 212.º/3 CRP) na medida em
que se tratam de relações materialmente
administrativas, na terminologia do prof. Mário Aroso Almeida.
Seguidamente,
temos de ter em conta o artigo 4.º do mesmo diploma. Penso que aqui podemos pôr
em causa duas alíneas do dito preceito: a) e c). Em primeiro lugar, temos de
ter em conta que estamos perante um situação que implica direitos ambientais,
os quais são constitucionalmente protegidos (Artigo 66.º CRP), e como tal,
podemos considerar como direito fundamental visto que implica o bem-estar do
ser humano. Em segundo lugar, é uma ação que visa analisar um ato
administrativo (uma providência cautelar sobre a construção das barragens
através da adjudicação à empresa enunciada, para anular a DIA – o ato
administrativo).
Desta forma,
estamos dentro do âmbito de jurisdição administrativa, sendo os tribunais
administrativos competentes para o julgamento da causa. Falta averiguar qual o
tribunal concretamente competente.
Pelos artigos 24.º
e 37.º do ETAF verificamos que tanto o STA como o TCA não têm, em 1.ª instância,
competência para tal, pelo que, e segundo o artigo 44.º ETAF, é o TAC o
tribunal competente. Tendo em conta que a localização da sede da Quercus é em
Lisboa, e aqui já no âmbito da competência territorial, é competente o TAC de
Lisboa (Artigo 16.º CPTA – regra supletiva).
Relativamente
ao recurso, o artigo 37.º ETAF diz-nos que é o TCA competente para estas matérias,
e, havendo apenas dois TCA’s, então o de Lisboa é o competente (não esquecer
igualmente o 20.º/6 CPTA).
Passando agora
para a averiguação da legitimidade das partes, há que ter em conta os artigos
9.º e 10.º para a legitimidade ativa e passiva, respetivamente. Desta forma, temos
de ver quem alega ser parte na relação material controvertida (9.º/1). Contudo,
penso estarmos perante um caso de extensão de legitimidade presente no 9.º/2,
na medida em que se trata de uma Organização Não Governamental, ou seja, uma
associação independente, e como tal, pode muito bem querer defender interesses,
neste caso, o ambiente e qualidade de vida. Do outro lado, o passivo, temos o
Ministério do Ambiente como aquele que a parte ativa considera como parte na
relação material controvertida (10.º/1 e 2 – O professor VPS discorda deste
critério entendendo que quem deve ser demandado é o órgão que realizou o ato,
página 273 e ss., O Contencioso
Administrativo no Divã da Psicanálise, Vasco Pereira da Silva).
Falta analisar
um pouco a providência cautelar propriamente dita. Como se sabe, esta é
instrumental a uma ação declarativa, só podendo ser intentada por quem tenha
legitimidade na ação principal, o que acontece neste caso, com a Quercus (112.º
CPTA); além do mais é provisória, pois está dependente do resultado da ação
principal, e sumária, visto que a sua decisão deverá ocorrer o mais breve
possível. Podemos considerar que se trata de uma providência conservatória pois
estamos perante a tutela de situações jurídicas finais pois a “satisfação do
interesse do titular não depende de prestações de outrem, pelo que apenas
pretende que os demais se abstenham da adoção de condutas que ponham em causa a
situação em que está investido” (Mário Aroso Almeida, Manual Processo Administrativo, página 446). Neste caso, a Quercus
pretende a manutenção de um direito ambiental que se encontra em perigo. Em
relação aos seus pressupostos, o que já referimos no 112.º/1 está preenchido
(tem legitimidade na ação principal); de resto também estamos perante
interesses públicos, diretos e pessoais. Pode ser apresentada tanto antes da
ação principal como após a instauração da mesma (114.º CPTA).
Sub-hipótese
E se, antes da
instauração da ação, a Quercus viesse impugnar o ato (ação administrativa
especial), nomeadamente a DIA?!
Antes de mais
tem de se tratar de um ato administrativo, na terminologia do 120.º CPA, e conjugando
com a posição do prof. MAA, deverá conter uma decisão de um órgão da AP que
visa produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta; tem de
definir situações jurídicas. Neste caso define a construção das ditas barragens,
através da dita DIA pois não indica situações prejudiciais. Desta forma,
reger-se-á pela Impugnação Ordinária (73 e ss. CPTA). Trata-se de um ato
administrativo com eficácia externa de conteúdo positivo (51.º CPTA) na medida
em que vem inovar (permissão para a obra), produzindo efeitos externos (a
construção).
A Quercus tem
legitimidade através do 55.º/1 c) pois está a defender o seu direito e
interesse, o do ambiente e bem-estar na qualidade de vida. O caso nada diz em
relação a datas de publicação, mas neste caso aplicar-se-ia o prazo de 3 meses
(58.º/2 b)).
Marisa Silva, aluna n.º 19 764
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