quinta-feira, 15 de novembro de 2012

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A Condenação da Administração à Prática do Acto Legalmente Devido

A consagração de uma acção de condenação da Administração à prática do acto administrativo legalmente devido (artigo 66º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, doravante "CPTA"), enquanto modalidade de acção administrativa especial, constitui uma das principais manifestações da mudança de paradigma, passando da mera anulação para a plena jurisdição, permitindo reagir contra comportamentos administrativos que por acção ou omissão, lesam direitos dos particulares decorrentes da negação de actos legalmente devidos. Importa referir que a admissibilidade de sentenças de condenação à Administração não é contrária a nenhum dos princípios da Justiça Administrativa, não sendo por isso plausível invocar o princípio da separação de poderes.
Tradicionalmente, e de acordo com o figurino francês, existia no Contencioso Administrativo a figura do recurso directo de anulação, sendo muito limitada a condenação da Administração. No decurso do século XX, surge na Alemanha a acção de condenação da Administração, sobretudo devido ao contributo doutrinário de Walter Jellinek. Em Portugal, com a Reforma do Contencioso Administrativo na década de oitenta, o legislador passou a admitir ao lado do recurso directo de anulação, um novo meio processual: a acção para o reconhecimento de direitos e interesses legalmente protegidos, plasmado no artigo 69° da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, doravante "LEPTA". Esta acção era destinada a assegurar a tutela efectiva dos direitos dos particulares nas relações jurídicas administrativas, funcionando como complemento dos demais meios processuais. Com a Revisão Constitucional de 1997, estabeleceu-se de forma expressa que a prática de actos legalmente devidos é uma componente essencial do princípio da tutela jurisdicional plena e efectiva dos direitos dos particulares em relação à Administração (artigo 268°, nº4 da Constituição da República Portuguesa, doravante "CRP").
De acordo com o disposto no artigo 66°, nº 1 do CPTA, existem duas modalidades de acção administrativa especial de condenação à prática do acto devido: 1) condenação à prática do acto ilegalmente omitido; 2) condenação à prática do acto ilegalmente recusado. Nesta matéria importa referir o artigo 71°, nº1 do CPTA, para se perceber que o que está em causa nesta acção de condenação é o próprio direito da relação jurídica substantiva e não um qualquer acto existente ou que devesse ter existido, uma vez que o Tribunal não se limita a devolver a questão ao órgão competente, pronunciando-se antes sobre a pretensão material do interessado, impondo a prática do acto devido.
No que diz respeito aos pressupostos da acção administrativa especial, o artigo 67° do CPTA prevê três hipóteses: não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido (alínea a)); tenha sido recusada a prática do acto devido (alínea b)); tenha sido recusada a apreciação do requerimento dirigido à prática do acto (alínea c)). Desta forma, podemos reconduzir estas três hipóteses a duas situações. Por um lado, e no caso da alínea a), a existência de uma omissão administrativa, que para ser juridicamente relevante implica que tenha havido um pedido do particular, apresentado ao órgão competente e que tenha o dever de decidir, não tendo havido decisão dentro do prazo legalmente estabelecido. Nestes casos, a regra era a de considerar tacitamente indeferidas tais pretensões, de forma a permitir a sua impugnação. Por outro, a existência de um acto de conteúdo negativo (alínea B) e c)), uma vez que tanto a recusa da prática de um acto favorável como a recusa liminar da Administração a pronunciar-se conduzem ao mesmo resultado: denegação do pedido apresentado pelo particular.

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