sábado, 24 de novembro de 2012

As sentenças no processo administrativo


No processo administrativo, interessa-nos as sentenças que tenham pronunciado sobre o mérito da causa excluindo-se deste modo as sentenças formais e as que decidam meros incidentes processuais. Assim, poderemos ter em face do princípio do pedido, sentenças declarativas de simples apreciação, de condenação e constitutivas, que correspondem à espécie de acção quanto ao fim (art.4º CPC).

No que toca às sentenças administrativas, estas podem ser reconduzidas aos tipos acima apontados, dada a sua aproximação ao processo civil, mas no entanto há algumas particularidades.

Nas acções constitutivas a sentença pode determinar a invalidação retroactiva de actos de autoridade o que levará ao restabelecimento da legalidade. Já as sentenças condenatórias, podem implicar a intimação de uma autoridade pública para a adopção de comportamentos ou mesmo a condenação à prática do acto legalmente devido. As sentenças de simples apreciação podem dizer respeito por exemplo a uma sentença que dê provimento a um pedido impugnatório em que se declara a invalidade de um acto da Administração.

As sentenças de execução são uma categoria autónoma, mas têm efeitos declarativos, nomeadamente podem ser de um dos três tipos supra apontados, ou seja, condenatórias quando determinam a entrega de uma coisa ou pagamento de quantia certa; simples apreciação - quando determinam a nulidade de actos administrativos contrários à sentença; constitutivas – quando anulam actos cuja manutenção seja ilegal, ou substitutivas quando produzam os efeitos de um acto administrativo devido.

É permitido pelo CPTA que se proceda à cumulação de pretensões no âmbito do processo de impugnação do acto administrativo ilegal, mas o não exercício dessa faculdade não preclude a possibilidade de as mesmas pretensões serem accionadas no âmbito do processo de execução da sentença de anulação – art 47º/3. Este é então o processo específico que o contencioso administrativo tem para a actuação processual das pretensões complementares em relação à pretensão anulatória e que se dirige ao cumprimento do dever de a Administração executar a sentença.

O efeito da sentença de anulação de actos administrativos é um efeito constitutivo pois traduz-se na invalidação do acto impugnado eliminando-o desde o momento da sua prática, ou seja, temos aqui uma eficácia ex tunc da sentença. Assim a administração tem de executar a sentença reconstituindo a situação que teria existido se não tivesse sido praticado o acto ilegal – efeito reconstitutivo da sentença. Tem também que respeitar o caso julgado, conformando-se com o conteúdo da sentença – efeito conformativo da sentença, pelo que a Administração não pode praticar um acto idêntico com os mesmos vícios pois violará o caso julgado, o que implicará a nulidade dos actos administrativos caso isto se verifique.

Estes efeitos são confirmados pelo art. 173º do CPTA, que nos vêm dizer, que o dever de execução de sentença de anulação de actos administrativos corresponde ao “dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado” faz ainda referência ao “respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado”.

A Administração pode ficar ainda vinculada ao “dever de remover, reformar ou substituir actos jurídicos e alterar situações de facto que possam ter surgido cuja manutenção seja incompatível com a execução da sentença de anulação” bem como no “dever de praticar actos dotados de eficácia retroactiva” para solucionar os efeitos imediatos do acto anulado – 173º nº2.

Assim, como afirma o Prof. Vieira de Andrade “no processo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos, o juiz não se limita a reafirmar o que já tinha sido decidido no processo de impugnação, mas, sim define a solução jurídica do caso, tendo em conta a posição administrativa”.

Portanto, através da sentença, a Administração deve reexaminar a situação de facto à luz da lei aplicável e dos fundamentos da sentença, para que deste modo, possa actuar em termos legais e correctos face à questão apresentada.

No processo administrativo, interessa não só o dispositivo da sentença mas também os fundamentos da anulação. As sentenças, em regra, produzem efeitos inter partes, pois esta vale para os interessados que estiveram no processo, sendo uma manifestação do princípio do contraditório e dos direitos fundamentais de audiência e de defesa. No entanto há excepções:

- Nos processos de impugnação de actos administrativos, onde as sentenças são constitutivas pois visam a eliminação do acto da ordem jurídica, este efeito vale erga omnes porque ninguém pode pretender que relativamente a si o acto não foi anulado. Contudo há ainda outro efeito, o efeito assertivo do julgado onde também se coloca o problema de saber qual o limite do caso julgado. Segundo o Prof. Vieira de Andrade deve-se distinguir a oponibilidade dos efeitos desfavoráveis da dos efeitos favoráveis da sentença em relação aos seus destinatários. Assim no que toca aos efeitos desfavoráveis da sentença anulatória, quanto aos prejudicados pela anulação do acto, os efeitos apenas se produzem inter partes abrangendo também os contra-interessados. Em relação aos efeitos favoráveis, i.e. ao alcance da anulação de um acto administrativo desfavorável, a regra é também a produção de efeitos inter partes, ainda que se admita a extensão da sentença a outras pessoas nos termos do art.161º nº1.
- Quanto aos efeitos das sentenças de declaração de ilegalidade de normas, com força obrigatória geral – art 76º - em que está em causa a própria irregularidade do regulamento, a sentença impõe-se a todos independentemente de terem sido partes no processo, ou seja, temos um efeito erga omnes
- Por último em relação aos efeitos das sentenças nas acções populares, estas têm, em princípio, eficácia geral atendendo à finalidade que têm na defesa de valores comunitários (art.19 Lei 83/95 – Acção Popular)[1]

O último aspecto a tratar no que toca às sentenças é a possibilidade da extensão dos seus efeitos que vem previsto no artigo 161º. Assim nos termos do nº1 os efeitos podem ser estendidos no caso de anulação de um acto administrativo desfavorável ou nos casos de reconhecimento de uma situação jurídica favorável às pessoas que se encontrem na mesma situação jurídica – no entanto ao admitir o pedido de extensão dos efeitos a quem não tenha recorrido pode fragilizar a estabilidade do caso julgado. Este pedido, só é possível, para situações em que haja vários casos perfeitamente idênticos e tenham sido proferidas cinco sentenças transitadas em julgado ou três sentenças se proferidas em processos seleccionados em situações de processos em massa – nº2 (a referência aos processos em massa tem como objectivo conseguir uma igualdade de tratamentos em casos perfeitamente idênticos). A extensão é primeiramente solicitada à Administração e não obtendo êxito na pretensão, ao tribunal que tenha proferido a sentença, sendo que neste caso se aplica com as devidas adaptações os trâmites do processo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos – nº4 - a razão desta remissão explica-se por o processo de execução de sentenças de anulação ter dimensões declarativas. Por último no nº6 permite-se a extensão dos efeitos da sentença a quem tenha impugnado o mesmo acto em outro processo, o que se justifica quando não tenha havido coligação ou apensação de processos.

Bibliografia:
- Mário Aroso de Almeida - “O novo regime do processo nos tribunais administrativos”
- Vieira de Andrade - “A justiça Administrativa”

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